Cuidados necessários com informações trazidas por Espíritos
Palestra de Cosme Massi na USE Intermunicipal — Catanduva em 07 de outubro de 2023; Bloco 1, Perguntas e respostas.
Transcrição de Rui Gomes Carneiro.
Pergunta. — Livros e mensagens produzidos por médiuns e assinados por Espíritos, alguns bem conhecidos, e cujo conteúdo não tenha passado por nenhum critério de validação, como o da universalidade adotado por Allan Kardec, podem ser entendidos como atualizações ou avanços na doutrina espírita? Quais são os cuidados para se afirmar que informações mediúnicas são parte integrante da doutrina espírita?
Resposta. — Muito importante essa pergunta. Kardec responde a essa pergunta no próprio texto que vimos, texto que chamou de “Controle universal do ensino dos Espíritos” e que foi publicado na Revista espírita e no Evangelho segundo o Espiritismo. Allan Kardec coloca esse texto admirável no início do Evangelho, mas muitas vezes os leitores não param ou refletem para aprofundar o texto, e então perceber a inteligência de Kardec.
Kardec propõe neste texto dois critérios fundamentais a serem utilizados quando se vai lidar com um ensinamento transmitido pelos Espíritos.
O primeiro critério, que é o primeiro a ser usado e é o mais importante, é a análise da mensagem proposta comparando seu conteúdo com as informações já bem estabelecidas pela ciência espírita, ou pelas demais ciências, no caso em que o Espírito aborde assunto que diga respeito às ciências do mundo. Quando o que ele fala diz respeito à ciência espírita, deve-se analisar se o que ele está afirmando está de acordo com aquilo que está bem fundamentado, bem apresentado no Espiritismo. E onde está esse bom fundamento? Nas obras de Allan Kardec.
Se o Espírito propõe algo contrário àquilo que está bem fundamentado no Espiritismo, é necessário que ele mostre onde está o erro do fundamento estabelecido por Kardec. Além disso, ele precisa mostrar que o que ele está propondo contraria um fundamento porque ele tem um argumento melhor do que os fundamentos que Kardec apresenta em suas obras. Feito isso, podemos começar a refletir sobre o texto; caso contrário, se ele não apresenta argumentos lógicos para discordar de Kardec, o texto reflete apenas uma opinião do Espírito, e como opinião não se vai considerá-la como parte da doutrina; porque é uma mera opinião, e opiniões nós temos diversas, não só dos homens, como também dos Espíritos. Opinião não é doutrina.
Então esse é o primeiro elemento do critério de controle universal: passar a mensagem recebida pelo crivo da razão, da lógica, verificando se ela não entra em contradição com aquilo que está bem fundamentado na ciência espírita ou, quando o Espírito trata de assuntos de outras ciências, verificar se está bem fundamentada nessas ciências.
Essa primeira parte é o primeiro elemento do crivo, e é o que está em nossas mãos fazer, é o que cada um de nós pode fazer, já que nós temos a doutrina bem fundamentada na obra de Kardec. Nós podemos ler o texto proposto e analisar se esse texto gera contradições com Kardec: se o texto tem contradições, vamos deixá-las de lado e considerá-las como meras opiniões.
É o que eu sugiro nas minhas palestras quando eu falo em catar feijão. Ler um texto é como catar feijão — desculpe, é uma metáfora tão antiga nessa época de internet, mas eu não consegui uma melhor. Como é que se cata feijão? Joga o feijão sobre a mesa e separa o que é feijão bom do que é feijão bichado e do que é pedra.
Em todo texto é preciso catar feijão. O que é um feijão bom? É aquilo que não entra em contradição com o que está bem fundamentado na doutrina espírita. O que é um feijão bichado? É aquilo que gera alguns tipos de choque, que está confuso, parece contrariar Kardec. E uma pedra é aquilo que está radicalmente contra o que está bem fundamentado.
Então, não é preciso falar mal do Espírito que escreveu, ou do homem que escreveu, se for um texto produzido por um encarnado; a pessoa está separando o ruim do bom, fica com o que é bom e o resto deixa de lado, considera como mera opinião daquele autor ou daquele Espírito.
Assim, Kardec já nos dá no primeiro critério do controle universal aquilo que devemos fazer com toda produção mediúnica, com todas elas.
E Kardec diz na Revista espírita que, de 3.600 comunicações que ele recebera, poucas ele podia aproveitar, cerca de 10%, as demais não podiam ser publicadas. Então era muito sério o trabalho de Kardec; muitos acham que porque um Espírito ditou um texto é uma verdade, mas se esquecem que os Espíritos nada mais são do que as almas dos homens, e, como tais, tem de todo nível. Não é porque o indivíduo se tornou Espírito que ele é dono do saber e do conhecimento.
Aliás, Kardec comenta em Obras Póstumas que o primeiro conhecimento que ele adquiriu quando começou os estudos espíritas, a primeira coisa que lhe marcou fortemente, foi essa ideia de que os Espíritos nada mais são do que as almas dos homens, então de todos os níveis, e que consequentemente é necessário olhar com cuidado aquilo que é ditado pelos Espíritos, do mesmo jeito que nós temos que olhar com cuidado aquilo que é escrito pelos homens, que são Espíritos encarnados.
Então esse é o primeiro critério, o cuidado que depende de nós, de cada um de nós, no controle universal.
O segundo critério, proposto por Kardec no controle universal, já não é mais atribuição nossa; algumas pessoas estão lendo mal o texto do controle universal, e não percebem o que Kardec coloca como segundo critério, não percebem que esse segundo critério está nas mãos dos Espíritos, não nas nossas.
Diz Kardec que quando os Espíritos desejarem apresentar um princípio novo, uma nova ideia, um fundamento, eles se comunicarão espontaneamente por médiuns que não se conhecem, em várias localidades, para dar essa comunicação. Então vejam que seriam comunicações espontâneas que os Espíritos trariam por médiuns diferentes que não se conhecem, assim trariam algum conhecimento novo. Se isso vai acontecer, se só aconteceu no tempo de Kardec, se vai acontecer no futuro, nós não sabemos, porque isso compete aos Espíritos.
Portanto, esse segundo elemento do critério não está em nossas mãos, o que está em nossas mãos é: apareceu uma comunicação dos Espíritos? Vamos examiná-la para ver se ela está bem fundamentada, se ela não entra em contradição com os fundamentos do Espiritismo. Se haverá um princípio novo que os Espíritos trarão, não está em nossas mãos.
Mas mesmo que surja algo novo, caberá a aplicação do primeiro critério, é por isso que Kardec coloca o primeiro como primeiro. Tudo que venha dos Espíritos, tudo, precisa passar por análise para ver se tem fundamento, se se apoia verdadeiramente naquilo que está bem fundamentado na doutrina espírita.
Então vejam que Kardec respondeu de forma admirável a esta questão apresentada, mostrando a nossa obrigação de estudar a obra para compreender quais são os princípios fundamentais bem estabelecidos da doutrina, para que, quando tivermos uma mensagem de um Espírito qualquer ou de uma pessoa encarnada, possamos afirmar: “Isso aí é a opinião dele. E se é opinião dele, precisa ser tratado como uma opinião, e não como uma verdade a ser incorporada na doutrina espírita.”
Kardec teve esse cuidado nos alertando, e ele fazia essa análise crítica, como eu já disse, com mensagens de vários Espíritos. Para citar um exemplo, durante os anos de 1858 e 1859, na Sociedade Espírita de Paris, havia um médium chamado sr. Roze, que recebia mensagens do Espírito de Verdade, Jesus, e muitas dessas mensagens foram publicadas e divulgadas por Kardec. Passado um tempo, nós não conhecemos bem os contextos históricos (pode ser que os historiadores que estão nos ouvindo possam mergulhar um pouco mais nesse contexto histórico), esse médium deixou a Sociedade Espírita de Paris e começou a divulgar várias mensagens. Inclusive, ele publica três livros (e na Kardecpédia você pode baixar os volumes em francês) que são recomendados no Catálogo Racional, que é o último livreto que Kardec publicou em março de 1869. Nesse Catálogo Racional Kardec colocou, então, os livros do sr. Roze, mas fez uma nota dizendo que os livros tinham conteúdos que a doutrina espírita não podia aceitar. E encontramos nesses livros mensagens do Espírito de Verdade, de São Luís e de vários outros Espíritos, todas recebidas por esse médium. Porque durante um tempo as mensagens eram boas, Kardec as aceitava, e depois, quando as mensagens ficaram ruins, ele as recusava. Quem ler os textos em francês vai dizer: “Nossa, isso aqui não é o Espírito de Verdade, mesmo, isso aqui está muito ruim.” Kardec fazia isso com o médium que recebia o Espírito de Verdade na Sociedade Espírita de Paris, ou Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, como era o nome oficial da Sociedade.
Então Kardec sempre teve esse cuidado.
Vou citar um outro exemplo curiosíssimo: um dos Espíritos que muito contribuiu para explicar os fenômenos espíritas com mensagens incríveis, que todos que leram provavelmente adoram, foi o Espírito Erasto. Esse Espírito tem em O Livro dos Médiuns mensagens extraordinárias sobre o papel dos médiuns na comunicação dos Espíritos, tem mensagens no Evangelho Segundo o Espiritismo, teve uma participação intensa junto a Allan Kardec na Sociedade Espírita de Paris apresentando textos extraordinários. O médium de Erasto, Senhor D’Ambel, saiu da Sociedade Espírita de Paris e começou a publicar um jornal espírita com mensagens de Erasto (e podemos ler esses jornais, eles estão à disposição, mas em francês, obviamente), e então veremos como a qualidade dos textos pioraram, e por que Kardec não usou esses textos.
Desse modo, veja o cuidado que ele tinha, mesmo com mensagens com grandes assinaturas: Espírito de Verdade, Erasto, Santo Agostinho, São Luís! A assinatura, diz Kardec não diz nada, o que diz é o conteúdo; há mensagens no Evangelho segundo o Espiritismo, na Revista espírita assinada simplesmente “Um Espírito” ou “Um Espírito Protetor”, e você lê e fica assim: “Meu Deus! que beleza, que profundidade, que grandiosidade!” Assinada simplesmente “Um Espírito”: Não é a assinatura o que importa.
Kardec vai dizer uma frase admirável em O Livro dos Médiuns: “Há falsários no mundo espiritual como os há na Terra”, e falsários que falsificam nomes e assinaturas; e aí comparam-se as assinaturas e se diz: “Mas é a mesma assinatura, igualzinha à que o Erasto usava, igualzinha à que o Espírito de Verdade usava!” Não, não é a assinatura, nem o médium que dá o valor à mensagem, o que dá o valor à mensagem é o seu conteúdo; não interessa o médium, não interessa a assinatura. Isso é consequência da ciência espiritual, é o que a ciência espírita nos mostra!
Mas as pessoas dizem: “Ah!, o médium é maravilhoso, é uma criatura boa, grandiosa!” E daí? Não é ele o autor da mensagem! Se ele é um médium honesto, ele não é autor da mensagem!
Eu costumo dizer que o médium é como um carteiro: o carteiro pode levar uma carta maravilhosa ou uma carta bomba. Ele é responsável pela carta? O médium só será responsável pela mensagem se ele colocar suas ideias na carta, se ele não permitir que o Espírito coloque o seu pensamento, e coloque os dele; nesse caso ele estará interferindo na comunicação que poderá ser ruim, porque ele atrapalhou. Mas se ele é um médium honesto, correto, que procura deixar que o Espírito expresse o seu pensamento, a responsabilidade pelo conteúdo é do Espírito, não interessa assinatura, não interessa o médium.
Mas nós não aprendemos a separar isso, gostamos de determinada pessoa porque é um médium, porque é um homem de caráter, uma pessoa do bem, e então achamos que tudo que ele produziu é maravilhoso. Acabei de citar o exemplo de D’Ambel, que durante bons anos deu contribuições extraordinárias para a obra de Allan Kardec, com mensagens belíssimas do Espírito Erasto, mas que depois começou a produzir mensagens ruins assinadas com o mesmo nome, ou o caso do Roze no outro exemplo.
Os médiuns, que estão encarnados nesse mundo de provas e expiações (eu não sou médium no sentido específico, só no sentido geral) os médiuns são, como estava dizendo, Espíritos imperfeitos como nós somos, então eles têm suas dificuldades, seus problemas, e, se forem honestos, deixarão os Espíritos escreverem o que eles quiserem, então a qualidade do conteúdo será responsabilidade dos Espíritos. Aí cabe ao estudioso verificar: “Olha, essa mensagem é boa, catei feijão e só tem feijão bom”. Ótimo! Ou: “Catei feijão e tem feijão bom, tem feijão bichado e tem pedra”. Neste caso, coma o feijão bom e deixe o resto de lado, sem criticar e falar mal do médium, falar mal do Espírito; é opinião dele. Não é assim com todos os textos? Nós não fazemos assim, ou não deveríamos fazer com todos os textos?
Porque nós, como Espíritos imperfeitos, cometemos erros, falhamos.
Kardec vai, na Revista espírita, apontar mudanças que ele fez, e ele fala: “Eu errei”. Pelo menos em dois momentos, ele usa essa afirmativa, que errou: um deles quando apresenta uma explicação para o médium que usava os chamados espelhos mágicos — era um médium que precisava de um vidro, de um copo, e, a partir do vidro do copo colocado na mão, dar uma informação. O médium começava a dizer coisas, mas ele precisava daquele copo. E Kardec, na Revista espírita, apresenta uma teoria sobre isso, e descarta o copo como uma necessidade: não precisava do copo, o copo ali era inútil. Um ano depois, na Revista espírita, ele afirma: “Eu errei, meus estudos mostraram que o copo era importante!”. Ele disse por que o copo era importante; mas eu não vou dizer aqui para que vocês, vão na Revista Espírita descobrir.
Ele fala: “Eu errei!” para corrigir o erro.
Quando ele, em O Livro dos Médiuns, estuda a obsessão, ele descarta a possessão. Diz que não há processos de possessão, não há possessos. Depois, na Revista espírita, ao aprofundar os estudos da possessão, num artigo intitulado “Senhorita Júlia”, ele vai afirmar: “Eu havia dito que não há possessão, mas errei!”. E volta atrás mostrando que há possessão, e explica.
Por isso quando se estuda A Gênese, no item sobre obsessão e possessão, vemos que ele fala da possessão e, quando se compara com O Livro dos Médiuns, se diz: “Espera aí, em O Livro dos Médiuns ele está dizendo o contrário!”. Sim, ele corrigiu e explica por que fez a correção na Revista espírita; isso é ciência, não é coisa mística. “O que veio dos Espíritos é perfeito!” — não, não é assim.
Então, esse cuidado ele tem para que examinemos o texto: tire o nome do médium e tire a assinatura.
A academia tem uma prática muito adequada, e que mesmo assim às vezes falha: alguém manda para uma grande revista científica um texto científico para ser publicado, e a equipe da revista, o editor, manda para pareceristas, pessoas que vão dar o parecer sobre aquele texto antes de publicar. Eu mesmo, quando estava atuando fortemente na Unesp, fui parecerista de algumas revistas, e eu recebia o texto sem o nome do autor para analisar; o nome do autor não era informado para que não interferisse na análise; e algumas vezes eu recusei textos, e depois eu descobri quem era o autor! Era uma pessoa que eu conhecia, ele não sabia que fora eu o parecerista; ou seja, eu recusei e não sabia que ele era o autor. Porque cabe ao parecerista analisar o texto, não a assinatura.
Então a Academia criou essa prática ao longo da história da ciência, aprendendo que esse era um bom caminho para se ter textos em que várias pessoas analisavam a boa estrutura do texto, a boa construção, os bons argumentos, sem se apegar na assinatura.
Kardec propõe isso no controle universal, propõe isso na Revista: analisar tudo, passar tudo pelo crivo da razão antes de considerar que é um texto que deve ser incorporado à doutrina espírita.
E hoje nós estamos vivendo esse fenômeno ao contrário, hoje, tudo o que os Espíritos publicam, as pessoas vão aceitando. “Ah! veio do médium fulano, do Espírito tal.”. Todo o mundo acha lindo, maravilhoso, vê naquele texto feijões bons e não enxerga os feijões bichados ou as pedras; para os bichados e as pedras, a pessoa fechou o olho porque viu a assinatura da mensagem, ouviu o nome do médium. E aí, pelo médium e pela assinatura, ele fica cego, ele não enxerga os feijões bichados, nem as pedras.
Não precisa criticar o médium ou a assinatura, coma só os feijões bons, o bichado e a pedra são a opinião do autor.
Vamos ver um exemplo de afirmações equivocadas: vários Espíritos que escreveram no Brasil pela mediunidade de grandes médiuns falaram contra a evocação. Um exemplo típico, eles falaram contra a evocação, sem dar argumentos para isso. O Espírito usa o que se chama de falácia do perigo: “É perigoso fazer vocação, não faça.”
Bom, é perigoso andar de bicicleta, é perigoso dirigir automóvel, é perigoso eu estar sentado aqui porque essa cadeira pode quebrar e então eu vou cair. Isso se chama, em Filosofia, falácia do perigo; sabia que é perigoso aplicar injeção e tomar injeção? É a chamada falácia do perigo!
A comunicação espontânea é tão perigosa quanto a evocação. E o Espírito que escreveu contra não disse isso, ele falou “a evocação é perigosa”, não disse que a comunicação espontânea também é. É o mesmo perigo. Aliás, Kardec vai, em um capítulo notável de O Livro dos Médiuns, escrever sobre os inconvenientes e perigos da prática mediúnica.
“Ah! Então como ela tem inconvenientes e perigos, eu não devo realizar a prática mediúnica?”
Não, não é assim.
Então, como se faz para minimizar o risco? Ensinando como fazer! E é o que Kardec faz em O Livro dos Médiuns, em um capítulo específico sobre as evocações, em O Livro dos Espíritos, ao falar sobre as evocações, na Revista espírita! Ele dá todos os argumentos, ele diz textualmente que é um erro não fazer evocação; e ele dá todos os argumentos.
Aí vem Espíritos, através de vários médiuns brasileiros, escrever contra a evocação, sem que eles deem argumentos que não sejam falácias! O único argumento que eu li em várias mensagens é que é perigoso! Bom, isso não é argumento, isso é falácia, e falácia é o que a se chama em lógica em filosofia de um argumento inadequado, impróprio, incorreto, inválido, que temos que descartar; porque perigoso é tudo!
É preciso saber fazer, e Kardec ensina como fazer a evocação, mostra de que maneira a evocação deve ser feita, quais os resultados que se obtêm, e o que é que se perde ao não fazer evocação. Está lá, Kardec explica tudo isso.
Aí vamos ficar com quem? Com a opinião de Espíritos que disseram contra as evocações, sem argumentos, usando uma falácia, ou com o que Kardec coloca bem fundamentado em O Livro dos Médiuns e em outras obras? Com quem vamos ficar? Com a opinião de um Espírito ou com aquilo que está bem fundamentado e argumentado? A escolha é da pessoa. Eu prefiro ficar com Kardec, sem falar mal do Espírito ou do médium.
Nem citei aqui os médiuns e os Espíritos que produziram isso, foram vários. Nem citei, porque a minha preocupação é com o conteúdo, não é com quem escreveu ou com quem recebeu a comunicação.
Então essa pergunta é muito boa para refletirmos na importância de analisar tudo que vem dos Espíritos.
Mas para fazer essa análise, é fundamental que se saiba, é necessário conhecer! Como nas revistas científicas, os editores mandavam um texto para eu dar parecer, mas sempre e apenas na minha área, naquilo que eu dominava; não me mandavam um texto cujo assunto eu não conhecia. Para eu poder identificar feijões bichados ou pedras, eu tenho que conhecer Kardec, eu tenho que ter base.
Assim, é preciso estudar bem as obras de Kardec, adquirir esses fundamentos, para, ao analisar um texto, poder dizer: “Olha, isso aqui não está bem fundamentado por isso, por isso, por isso e por aquilo. Kardec trata muito bem disso em suas obras, lá estão todos os argumentos, então eu vou ficar com ele, e não com essa opinião pessoal”. Sem precisar brigar, ofender, agredir, desrespeitar, faltar com caridade ao Espírito e ao autor.
Por isso se diz que a caridade é com o Espírito, com o autor, com o médium, não com o texto! Não se tem caridade com texto. Com texto, usa-se a análise rigorosa da razão. Com o autor, temos que ser caridosos, respeitá-lo, mas com o texto que ele produziu, não! Ou o texto é verdadeiro, é correto, ou não é, e ponto! E se o autor ou o Espírito ficarem chateados, o problema é deles!
Diz Kardec que, se um Espírito superior não aceitar a crítica a um texto que ditou, ele está provando que não é superior; é como acontece na Revista quando Kardec crítica textos de determinados Espíritos e eles reconhecem, demonstrando sua superioridade.
Há um texto assinado Vicente de Paulo, que está na Revista espírita e em O Evangelho segundo o Espiritismo. Quando Vicente de Paulo dita o texto, que seria publicado na Revista, Kardec faz várias perguntas questionando o texto, cujo título era “Caridade”. Isso na Revista Espírita. Quando Kardec coloca esse texto no Evangelho, ele põe no item “Beneficência”, não mais em “Caridade”. Ele mudou o título do texto, que dizia respeito de fato à beneficência e não à caridade. E aí constatamos que as partes do texto que Kardec cortou eram as que ele criticara na Revista espírita. Para checar isso basta digitar “beneficência Vicente de Paulo” na busca da Kardecpédia, e se terá acesso aos textos no Evangelho e na Revista espírita.
Então, é bom senso. Analisar sem desrespeitar o autor, sem faltar com caridade ao médium ou ao Espírito, mas não deixar de passar o texto pela análise fria e racional, aceitando o que é bom e recusando aquilo que é mera opinião do Espírito ou do homem que escreveu um texto, já que o que eu estou falando vale não apenas para os textos dos Espíritos, vale também para meus livros, vale para qualquer texto. Deve-se catar feijão em qualquer texto.
E eu recebi críticas aos meus textos, não deixei de aceitar. Eu agradeço aqueles que criticam: “tem um problema ali”; e eu falo “muito obrigado”.
E, só para encerrar, eu me recordo de que uma vez eu recebi o e-mail de uma pessoa dizendo para mim: “Professor Cosme, eu assisti ao vídeo que o senhor fez há uns 20 anos — eu nem me lembrava mais — numa palestra na cidade tal, e agora eu ouvi um vídeo recente do senhor numa outra palestra em que o senhor fala o contrário”. Eu respondi para ele: “Olha, amigo, eu aprendi, reconheci o meu erro e consertei; eu sou Espírito imperfeito, me perdoe. Eu errei, aprendi e mudei.” Eu achei que ele fosse gostar, não é? Mas ele me respondeu o e-mail: “Mas como é que o senhor errou?!”, mas grosso, duro comigo; eu respondi: “Meu amigo, me desculpa, eu não sabia que o meu erro fosse causar tanto problema para você.”
É que se cria uma onda achando que o orador espírita, o médium espírita, que são pessoas boas, são homens especiais que não erram, que não têm defeitos! Não vamos cair nessa história, nós, autores, médiuns, Espíritos, somos Espíritos imperfeitos com os nossos defeitos, nossos erros, nós precisamos da benevolência de todos, da caridade de todos; mas os nossos textos não, é rigor, é análise. Sejam caridosos para comigo, mas com os meus textos, não.
Então temos Kardec nos ensinando que na ciência a nossa preocupação deve ser com a verdade, não com as pessoas, é com a verdade. O texto está ali para apresentar a verdade, venha de onde vier, tenha a assinatura que tiver.
Não se preocupe com a assinatura nem com o médium, se preocupe com o conteúdo; com isso você vai engolir menos feijões bichados, menos pedras.
Observação. O texto acima foi retirado de uma exposição de viva voz. Como todo ensino oral, esta colocação pode não ser tão rigorosa com os sentidos das palavras, por efeito da proximidade entre as pessoas que conversam. É preciso, por isso, considerar que as definições dadas podem ser provisórias, e que alguns termos são usados em sentido figurado. Em todo caso, o fundo da mensagem não deixa equívocos.
Cosme Massi é Físico, Doutor e Mestre em Lógica e Filosofia da Ciência pela UNICAMP. Foi professor, pró-reitor e diretor de diversas universidades no Brasil. Ganhador do Prêmio Moinho Santista em Lógica Matemática. Escritor, palestrante e estudioso das obras e do pensamento de Allan Kardec há mais de 30 anos. Idealizador do IDEAK (Instituto de Divulgação Espírita Allan Kardec) e da KARDECPEDIA, plataforma grátis para estudos das obras de Allan Kardec. Reúne mais de duzentas aulas de Espiritismo na plataforma KARDECPlay.
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