O Espiritismo e a Filosofia
Mayara Paz (FEB) e Yoko Teles (FEB) entrevistam Cosme Massi* (IDEAK — Kardecpédia e KARDEC Play).
Entrevista gravada como o 25.o
episódio do Podcast “O Espiritismo em Pauta”, da Federação Espírita Brasileira, com o título “O Espiritismo e a Filosofia”.
Este Podcast é uma produção da Federação Espírita Brasileira, e pode ser ouvido em https://febpodcast.com.br/podcasts/espiritismo-em-pauta. O Espiritismo em pauta: o olhar do Espiritismo sobre o seu cotidiano.
Transcrição de Rui Gomes Carneiro.
Yoko Teles. — Allan Kardec, em sua obra “O que é o Espiritismo?”, sintetiza a doutrina espírita no seguinte pensamento:
“O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência prática, ele consiste nas relações que se estabelecem entre nós e os Espíritos. Como filosofia, compreende todas as consequências morais que dimanam dessas mesmas relações.”
A filosofia, um dos três vértices basilares do Espiritismo, nos propicia expandir e quebrar paradigmas, além da reflexão diária necessária para ressignificarmos a vivência na Terra. Para essa reflexão sobre o aspecto filosófico da doutrina dos Espíritos, trouxemos o nosso convidado especial de hoje para um bate-papo: o palestrante e estudioso Cosme Massi. Seja muito bem-vindo, Cosme!
Cosme Massi. — Obrigado, Yoko! É uma alegria estar aqui com vocês para conversarmos sobre o Espiritismo.
Mayara Paz. — Na edição de junho de 1862 da “Revista espírita”, Kardec publicou o texto “O Espiritismo filosófico”, psicografia, pela sr.a Collignon, do Espírito Bernardin, onde tece provocações sobre a filosofia, a moral e a doutrina dos Espíritos. Nele, Kardec comenta:
“A filosofia não é uma negação das leis estabelecidas pela Divindade; é a busca do que é sábio, do que é o mais exatamente razoável. E o que pode ser mais sábio, mais razoável, que o amor, e o reconhecimento que se deve ao seu criador?”
Cosme, podemos, assim, dizer que o Espiritismo é considerado uma filosofia?
Cosme Massi. — Não tenha dúvida. Aliás, como foi lido inicialmente, no próprio “O que é o Espiritismo?”, Allan Kardec deixa isso de forma muito clara. Ele diz que a parte filosófica estuda as consequências das relações entre os homens e os Espíritos, relações essas que foram estabelecidas pela ciência espírita. Aqui vale a pena uma observação que é muito importante. Quando se diz que o Espiritismo é uma filosofia, não se pode confundi-lo com um sistema filosófico, do tipo do sistema de Kant, ou de Hegel. O Espiritismo não é um sistema filosófico, como, às vezes, algumas pessoas poderiam pensar. Kardec foi muito lúcido em dizer que a filosofia espírita surge como consequências morais dos estudos da ciência espírita. Isso significa o seguinte, para a gente explicar de uma forma bem simples: o Espiritismo é uma espécie de uma filosofia de uma ciência — e não filosofia da ciência; muito cuidado. Filosofia da ciência é um ramo da filosofia que discute o próprio conceito de ciência, de método científico, de conhecimento científico. Filosofia de uma ciência são reflexões filosóficas a partir daquilo que uma ciência apresenta na sua teoria, baseada na experimentação.
Então, quando Allan Kardec estuda os fenômenos espíritas, a partir desses fenômenos espíritas ele cria a filosofia espírita: a partir dessa interação com os Espíritos. E analisando essa ciência, essas leis que regulam a vida na vida dos Espíritos e suas interações com os homens, nascem, então, consequências filosóficas desse estudo dessa ciência. Então é algo muito parecido com o que é hoje, por exemplo, a filosofia da física, em que se extraem consequências filosóficas daquilo que a física apresenta. Então o Espiritismo é, sim, uma filosofia, mas deve ser entendido como uma filosofia apoiada na ciência espírita. Não se trata de uma filosofia especulativa em que o indivíduo, sozinho, raciocina e vai criando o seu sistema; não é isso, não se trata desse sentido de filosofia, que é aquele que encontramos em Kant, em Descartes, em Hegel: essa reflexão racional pura e simples. Não; o Espiritismo é o uso da razão baseada na ciência espírita. Só se pode, portanto, falar de uma filosofia espírita a partir da própria ciência espírita. Por isso essa definição primorosa de Allan Kardec, que foi lida aqui no começo, dizendo que ela consiste nas consequências morais que surgem dos estudos que a ciência espírita apresenta. Então, o Espiritismo é, sim, uma filosofia, mas muito mais uma filosofia de uma ciência do que, propriamente, um sistema filosófico.
Yoko Teles. — Cosme, ao longo da história da humanidade, diversas teorias foram formuladas para descobrir, ou indicar o caminho para o homem, a partir do pensamento filosófico, como você apresentou para a gente agora, não é? Entende-se como filosofia a busca por compreender as viciscitudes da alma, sua natureza, suas faculdades: enfim, sua origem e seu destino. Então, nesse sentido, como a filosofia espírita contribui para a formação do homem de bem?
Cosme Massi. — Veja, quando nós falamos no homem de bem, pressupomos que esse “bem” seja aquilo que corresponde às leis naturais. Então, comportar-se como um homem de bem é comportar-se segundo leis naturais. E aí está uma diferença muito importante entre a chamada moral (ou ética) espírita e a moral (ou ética) de muitas outras doutrinas, sejam elas religiosas ou filosóficas. Se nós olharmos, por exemplo, a moral do Novo Testamento, apresentada por Jesus, perceberemos que ela foi apresentada com a autoridade do próprio Cristo; ela está apoiada na autoridade de uma pessoa. Se nós olharmos os sistemas morais que vêm desde a Grécia antiga, de Platão, de Aristóteles, eles também estão apoiados em uma pessoa, que apresentou seus pensamentos, seus argumentos. Não é assim que a moral espírita surgiu. Ela foi apoiada na ciência espírita. A partir do momento em que os Espíritos se manifestaram, e o fenômeno espírita se colocou, e Kardec e os Espíritos deram a explicação desse fenômeno, foi possível disso extrair uma ética que regula a conduta dos Espíritos — encarnados, os homens, e dos próprios Espíritos desencarnados.
Então essa ética surgiu da ciência espírita e tem apoio nas leis naturais e não na autoridade, o que é muito diferente. Você pode duvidar da autoridade de um livro ou da autoridade dessa ou daquela pessoa. Você pode cogitar uma outra proposta. Já com o Espiritismo, não; a ética espírita nasce a partir daquilo que representa, verdadeiramente, a vida após a morte. Então, para você saber que a virtude e a caridade são fundamentais para a felicidade da alma após a morte, você não precisa acreditar nisso; você pode conversar com os Espíritos que estão vivendo no mundo espiritual, e eles vão relatar os efeitos de quando você vive a lei de amor e caridade, e os efeitos de quando você não pratica a lei de amor e caridade. Então, são leis naturais, que regulam a felicidade do Espírito; não são leis baseadas numa autoridade. O apoio são os fatos da vida do próprio Espírito. Com isso, o homem de bem que estuda o Espiritismo vai encontrar um suporte racional muito forte para continuar vivendo a lei de amor e caridade, para continuar sendo um homem de bem, porque ele sabe, agora, que ele tem o apoio dos fatos, que os Espíritos relatam. Então não é só uma questão de autoridade; é muito mais do que autoridade: são o suporte e o apoio da lei natural.
É assim que Kardec vai, em uma obra admirável, que é a “Viagem espírita em 1862”, no seu diálogo terceiro (e o recomendo àqueles que queiram aprofundar a temática), falar da importância da caridade, como essa lei que vai fazer as transformações sociais. Mas ele vai dizer que a caridade tem que estar apoiada em uma crença sólida, pois, se não, as pessoas não vão praticar a caridade. Imagina, você falar para um materialista, que acredita que a vida acaba com a morte, que ele deve praticar a caridade, renunciar a benefício dos outros, amar o próximo desinteressadamente, fazer o bem. . . Ele não vai ter uma razão para isso. Agora, no momento em que você tem uma crença sólida, que prova que a vida continua, que tudo que a gente vive e faz tem consequências, seja na vida após a morte, seja em encarnações futuras, o homem vai pensar duas vezes; vai perceber que não se trata de uma proposta moral de autoridade, mas se trata de uma lei científica, uma lei moral logicamente dedutível de leis científicas. Então ele vai pensar duas vezes. Ele sabe que não vai escapar dessa lei natural; ele vai fazer todo esforço para vencer a si próprio, porque ele sabe, e não apenas imagina, que ao fazer isso ele estará construindo um mundo melhor. Então, o homem de bem passa a ter um argumento muito importante para ser homem de bem e se esforçar permanentemente na prática da lei de amor e caridade, já que essa lei agora tem um fundamento na ciência espírita, e não apenas na autoridade. Está bem?
Mayara Paz. — Estudo, caridade. . . Eu fui anotanto aqui, Cosme. . . Leis naturais, ciência. . . Excelente explicação. Estou aprendendo muito, viu?! Cosme, na obra “O que é o Espiritismo?”, Kardec nos aponta que somente com a percepção e observação da fenomenologia das mesas girantes foi possível introduzir, de forma metodológica, a doutrina filosófica e a ciência espíritas, como ferramentas de compreensão e aprofundamento do pensamento dos Espíritos. Segue-se o comentário:
“Há duas coisas no Espiritismo: a parte experimental das manifestações, e a doutrina filosófica.”
Pensando, então, Cosme, no tríplice aspecto da doutrina, como a ciência e a filosofia se conectam com a religião?
Cosme Massi. — Veja. Allan Kardec responde a essa questão de maneira admirável na Revista espírita, em dezembro de 1868, em um artigo extraordinário sobre a comunhão de pensamentos. Ele trata do uso da palavra “religião” para o Espiritismo. Você verifica, naquela leitura da definição que Allan Kardec dá no preâmbulo de “O que é o Espiritismo?”, que ele coloca o Espiritismo como ciência e como filosofia. Lá naquele artigo, ele diz que você pode usar a palavra “religião” para o Espiritismo se você usar a palavra no sentido filosófico, que ele vai bem explicar. Por que se você olha a palavra no sentido usual, ou no sentido teológico, você vai ver que o Espiritismo não poderia ser uma religião. As religiões têm dogmas, têm rituais, têm práticas exteriores de adoração e culto, têm sacerdotes, têm hierarquia sacerdotal. . . Então ele não pode ser uma religião no mesmo sentido em que o Catolicismo e o Protestantismo são religiões. Então, Kardec vai explicar, o Espiritismo é uma religião no sentido filosófico do termo, significando religar, ligar os homens entre si, numa comunhão de pensamentos. É um laço, diz Kardec. Que laço é esse? Como ele se constitui? Ele se constitui pela caridade, pelo sentimento de amor, por essas leis naturais e morais que o Espiritismo apresenta; que permitem ao homem ter uma vida de felicidade e uma ligação com Deus, ao mesmo tempo.
Como essas são leis naturais, que foram elaboradas pelo próprio Deus (o homem apenas as descobre; elas estão na natureza), e essas leis regulam a vida da alma, os homens, ao entrarem em comunhão pela prática do amor e da caridade, entram em comunhão com o próprio Criador, com Deus. Então aí nós temos esse laço profundo, que constitui uma religião, nesse sentido filosófico, e não no sentido usual ou teológico.
Agora, nesse mesmo artigo de Bernardin, ele fala que a religião é uma filosofia (está logo no segundo parágrafo). Por quê? Porque se a religião espírita o é no sentido filosófico, ela decorre da própria filosofia. Ela está dentro da própria filosofia, ela é um eixo importante desta filosofia. Por isso se explica por que Allan Kardec não distinguiu a terceira palavra em “O que é o Espiritismo?”; ele disse apenas “ciência” e “doutrina filosófica”, porque a religião, no sentido filosófico, é parte da própria filosofia, porque ela decorre das leis morais que vinculam os homens entre si e com Deus. Então aí surge uma religião filosófica, uma religião nesse sentido amplo, que não depende de rituais, de cultos, de adoração, de sacerdócio, mas que permite aos homens viver nessa comunhão extraordinária entre si mesmos e com Deus, pela prática da caridade.
Então é esse o sentido extraordinário em que Kardec percebeu que você poderia usar essas três palavras. Então, sintetizando: o Espiritismo é uma ciência, no sentido daquilo que todo o mundo considera uma ciência, uma construção que se apoia nos fatos e na razão; ele é uma filosofia de uma ciência (não um sistema filosófico), e é uma religião no sentido filosófico da palavra, porque funda o laço de união entre os homens na lei de amor e caridade, permitindo assim a ligação com o próprio Criador.
Yoko Teles. — Perfeito, Cosme. Nesse sentido, a gente vai continuar essa mesma linha de pensamento. Como a filosofia contribui na evolução do Espírito encarnado?
Cosme Massi. — Aí a gente percebe algo especial. Se a gente tivesse uma pura filosofia (no sentido em que Descartes fez, e Descartes já falava da alma, Kant também, etc.), nós não teríamos a força que o Espiritismo apresenta. Por quê? Porque esses filósofos apresentaram as suas próprias ideias, pensando, imaginando refletindo sobre o que seja a alma. Eles trouxeram grandes contribuições para o estudo da alma e da própria ética, formulando, inclusive, éticas muito próximas da ética que o Espiritismo iria apresentar. No entanto faltou a eles uma compreensão clara do que é a alma. De onde veio essa alma? O que ela é? O que ocorre a ela no processo encarnatório? O que ocorre a ela após a morte do corpo? Como se dá a sua vida na erraticidade, nesse mundo espiritual? O que ocorrerá em vidas futuras, em outros mundos, na própria Terra? Como se dá o seu processo evolutivo? suas provas, expiações? Ou seja, só o Espiritismo alcançou uma clara compreensão sobre as almas, uma vez que demonstrou sua existência, a partir dos fenômenos, e pôde fazer com que elas mesmas explicassem como se dá o seu processo evolutivo. Então não foi uma hipótese que Allan Kardec criou; ele não inventou o processo evolutivo dos Espíritos: os próprios Espíritos puderam, então, dizer de que maneira se dá sua evolução e qual a importância das leis morais nesse processo evolutivo. Então, só com o Espiritismo, e nunca antes do Espiritismo, se explicou exatamente o que é a alma, de onde ela veio, para onde ela vai, e como se dá seu processo evolutivo.
Então esse é um processo diferencial muito importante. Não é a especulação de um homem inventando o que acontece após a morte do corpo. Não. São fatos apoiados nos próprios textos que os Espíritos colocaram. Então vou citar um exemplo, e, para aqueles que estão nos ouvindo, isso vai ficar mais concreto. Kardec não disse ou inventou o que aconteceria com os suicidas. O que ele fez? Conversou com os Espíritos que cometeram o suicídio. Uma vez que a alma existe e pode se comunicar, por que eu vou ficar imaginando o que ocorre com ela? Vamos conversar com elas, e vamos conversar com os Espíritos superiores para eles nos explicarem o estado dessas almas. Então, dessa forma a gente compreende o que se passa com os suicidas, não porque a gente tenha imaginado isso, mas porque os próprios suicidas, e outros Espíritos, superiores, vieram esclarecer o que ocorre. E é assim em todas as situações. Nada melhor do que os próprios Espíritos para dizer como estão vivendo e o que ocorre cosigo após a morte do corpo. Então, essa é uma diferença fundamental no processo evolutivo da alma. Você compreende a evolução do Espírito a partir do ensinamento dos próprios Espíritos, e não da invenção de um único homem.
Mayara Paz. — Muito bom. Ou seja: é a fé raciocinada, não é? Os Espíritos nos trouxeram todo o conhecimento, e nós temos, realmente, até a responsabilidade, não é? do cuidado com ele, mas não podemos dizer que não sabemos. Essa é uma verdade.
Cosme, ainda na "Revista espírita" de junho de 1862, o Espírito Bernardin apresenta a seguinte reflexão:
“Sob o ponto de vista filosófico, é a linha de coduta reta e sábia que vos deve conduzir à felicidade que todos ambicionais, e esta linha vos é traçada partindo de um ponto seguro demonstrado: a imortalidade da alma, para chegar a um outro ponto que ninguém pode negar: Deus."
É possível, Cosme, a partir do pensamento filosófico espírita, colaborar com um mundo de paz, em momentos em que os conflitos e emoções atuais ganham protagonismo nas redes sociais, por exemplo?
Cosme Massi. — Bom, o seu raciocínio, Mayara, foi muito importante, essa sua questão sobre como o Espiritismo poderia nos ajudar nos dias atuais, com esses conflitos. Antes, no entanto, eu gostaria de fazer uma reflexão sobre o texto que você leu desse Espírito Bernardin. Ele fala que o Espiritismo chegou a um ponto seguro, que é a alma, e a partir dessa prova da alma ele chegou a outro ponto seguro, que é Deus. Essa é uma diferença fundamental que o Espiritismo foi o único capaz de realizar, porque todos os filósofos que tentaram chegar até Deus, provar a existência de Deus, se apoiavam apenas na razão, em raciocínios. Então, eles acabaram fracassando, como o grande filósofo alemão Kant demonstrou em sua obra: não é possível provar, simplesmente por raciocínios, que Deus existe ou que Deus não existe. Ou seja, a existência ou a não existência de Deus não é passível de prova pela simples razão.
Kardec não seguiu por esse caminho, e Bernardin está explicitando exatamente qual foi o caminho. A partir dos fenômenos espíritas, da interação dos Espíritos com os homens, se chegou à alma, a uma demonstração científica da existência da alma. A alma existe. Os fenômenos espíritas assim o estabeleceram. Uma vez que se chegou à alma, na interação com essas almas se perceberam leis morais que regulam a a vida destas almas, e que essas leis foram estabelecidas por Deus. Então a existência de Deus surge a partir da existência da própria alma e das leis que regulam a vida do Espírito. Perceba que é uma diferença muito importante. A alma foi o primeiro ponto seguro que Allan Kardec tomou (e não o puro e simples raciocínio) para chegar até Deus.
A existência de Deus, e as leis que regulam a vida da alma, foram resultado de uma demonstração científica muito sólida, muito bem construída. Bom, o que significa isso? No momento, agora, em que você tem uma moral, tem leis naturais e uma visão acerca da Divindade muito bem estabelecida, isso produz reflexões profundas no homem. E a partir do momento em que ele vai estudar essas leis naturais, morais, que regulam a existência, ele vai descobrir algo curioso, que fica estabelecido na décima lei moral, a lei de justiça, de amor e de caridade — nesta ordem; primeiro justiça, depois amor e caridade. A justiça consiste em cada um respeitar os direitos dos demais. Ora, eu não posso amar alguém, ou praticar a caridade com esse alguém, sem respeitar os seus direitos. Aliás, Aristóteles já havia demonstrado, em sua obra “Ética a Nicômaco”, que toda virtude pressupõe a justiça. Não se pode praticar nenhuma virtude sem a justiça. Porque primeiro você tem que respeitar os direitos, para então poder amar, praticar a caridade.
Se nós olharmos, no mundo de hoje, para os conflitos, qual tem sido o nosso maior erro? Nós não estamos sendo justos. Nós estamos falhando no primeiro item mais importante, que é a justiça. Não estamos respeitando os direitos dos outros. Estamos nos considerando como se tivéssemos mais direitos do que as outras pessoas. Isso explica os conflitos. Aliás, a guerra decorre de não praticarmos a justiça. Você pode olhar; todas as guerras significam desrespeito aos direitos dos demais. Ora, agora eu pergunto àqueles que estão nos escutando: se eu não consigo nem praticar a justiça, ainda, porque não sou capaz de respeitar os direitos, como eu poderia falar em viver o amor e a caridade, que estão além — e não aquém — da justiça?
Então, a gente tem que primeiro, neste mundo em que estamos vivendo, em que as pessoas estão desrespeitando e agredindo umas às outras, por redes sociais, por meios de comunicação, em que você não pode ter uma ideia diferente, uma proposta diferente, que a pessoa vem atacando você pessoalmente, em que a discussão de ideias saiu do plano racional do diálogo respeitoso, da argumentação, e foi para o plano da agressão pessoal, da ofensa e da injúria, tudo isso produzindo conflitos, seja no interior da família, da sociedade, seja entre nações. São conflitos que decorrem de não praticarmos a primeira parte da décima lei, que é a lei de justiça, amor e caridade. Eu estou esquecendo de ser justo. E é muito engraçado que tem gente falando em amor e caridade desrespeitando os direitos das outras pessoas! Isso é uma contradição. Não se pode falar em amor e caridade sem justiça.
Então, que a gente possa estudar essa décima lei. Que aqueles que nos acompanham, e têm interesse pelo Espiritismo, mergulhem nessa décima lei moral, que se encontra na admirável obra “O Livro dos Espíritos”; verão Kardec explicando a justiça, primeiro, e depois o amor e a caridade, nos ensinando a respeitar o direito dos outros em primeiro lugar, para que possamos aprender a amá-los, a tratá-los com caridade, a viver em um clima de paz. Sem amor e caridade, vai dizer Kardec nesse texto que eu citei, da “Viagem espírita em 1862”, em seu diálogo terceiro, só a vivência do amor e da caridade vai produzir uma sociedade verdadeiramente equilibrada, feliz e de paz.
Não esperemos soluções miraculosas; que alguém virá “de cima para baixo” e mudará o mundo, que transformará tudo por meio de leis. Não é assim o caminho; nós só vamos mudar o mundo quando nós mudarmos o nosso próprio mundo interior. Quando a gente viver essa lei de justiça, de amor e de caridade é que a gente vai ser capaz de construir um mundo melhor, porque quem decide, quem escolhe, são as pessoas; as pessoas é que fazem leis, as pessoas é que vivem as leis, as pessoas é que praticam as leis. Se elas não introjetarem em si esse sentimento de justiça, amor e caridade, será impossível a construção de um mundo melhor. Então, nós convidamos a todos que assistem a nós, nesse programa tão importante promovido pela Federação Espírita Brasileira, em que temos condições de mostrar o que é o Espiritismo e de que maneira o Espiritismo pode contribuir para um mundo melhor, convidamos cada um a viver esse pensamento espírita. Não adianta estudar Espiritismo, conhecer Espiritismo, aprofundar Espiritismo, se não colocamos em prática essas leis morais. Somente na prática dessas leis, que são individuais, cada um praticando por si, o mundo se transformará em um mundo melhor, e nós poderemos ter uma rede social em que as pessoas interagem para aprender, para serem úteis, respeitando umas às outras, evitando tantos conflitos, que começam, às vezes, no interior de uma pequena comunidade e se espalham para o mundo, pelo esquecimento do dever de primeiro ser justo, e de então praticar o amor e a caridade.
Yoko Teles. — Obrigada, Cosme. Mais uma vez agradecemos, Cosme, pela sua disponibilidade para participar de nosso bate-papo. Foi muito, muito rico, principalmente para mim, posso dizer, em particular. Certamente sairemos desse encontro com a cabeça cheia de questionamentos e novas percepções, tanto sobre o Espiritismo quanto sobre o mundo à nossa volta.
Mayara Paz. — Um episódio muito rico, Cosme, com muitas reflexões sobre nossas responsabilidades, sobre o olhar sobre si e sobre a vida em sociedade. Realmente muito bom, saiba que o convidaremos muitas outras vezes, porque, assim como a Yoko, eu acho que foi uma manhã de muito aprendizado para mim também, e para os nossos ouvintes, então a nossa gratidão por ter aceitado esse convite.
Cosme Massi. — Obrigado, Mayara! Obrigado, Yoko! Obrigado a todos vocês! E parabéns pelo trabalho, parabéns à Federação, pela iniciativa de divulgar o Espiritismo para o mundo por todas as formas possíveis, o que é o compromisso de todos nós que amamos o Espiritismo, não é? levar o Espiritismo para o mundo por todas as formas: vídeos, áudio, internet. . . Por quê? A melhor coisa que podemos fazer é divulgar aquilo que a gente sabe que faz tão bem para a gente, não é? Se faz tão bem para a gente, certamente vai fazer bem para todo o mundo. Então, parabéns a vocês, parabéns à Federação Espírita. Estou aqui à disposição; quando precisarem, será um prazer estarmos juntos.
Mayara Paz. — Obrigada, Cosme. Nós agradecemos também a todos os ouvintes por estarem conosco. Continuem nos acompanhando!
Caso desejem enviar sugestões de temas, ou falar diretamente conosco, basta enviar um e-mail para comunicacao@febnet.org.br. Até o nosso próximo encontro!
Yoko Teles. — E se você gostou do Podcast “O Espiritismo em pauta”, não esqueça de nos seguir no seu agregador de áudio; basta procurar por “FEB Podcast” ou “Federação Espírita Brasileira”. Até a próxima!
Mayara Paz. — Até lá!
Este Podcast é uma produção da Federação Espírita Brasileira, e pode ser ouvido em https://febpodcast.com.br/podcasts/espiritismo-em-pauta. O Espiritismo em pauta: o olhar do Espiritismo sobre o seu cotidiano.
*Observação. O texto acima foi obtido de uma exposição de viva voz. Como todo ensino oral, esta colocação pode não ser tão rigorosa com os sentidos das palavras, por efeito da proximidade entre as pessoas que conversam. É preciso, por isso, considerar que as definições dadas podem ser provisórias, e que alguns termos são usados em sentido figurado. Em todo caso, o fundo da mensagem não deixa equívocos.
Cosme Massi é Físico, Doutor e Mestre em Lógica e Filosofia da Ciência pela UNICAMP. Foi professor, pró-reitor e diretor de diversas universidades no Brasil. Ganhador do Prêmio Moinho Santista em Lógica Matemática. Escritor, palestrante e estudioso das obras e do pensamento de Allan Kardec há mais de 30 anos. Idealizador do IDEAK (Instituto de Divulgação Espírita Allan Kardec) e da KARDECPEDIA, plataforma grátis para estudos das obras de Allan Kardec. Reúne mais de duzentas aulas de Espiritismo na plataforma KARDECPlay.
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