Maio 2018 • O padeiro desumano
Leitura Mensal
Ano 04 | Edição 230 | Maio • 2018 | Revista Espírita - Jornal de estudos psicológicos 1862 > Maio > O padeiro desumano
Texto extraído do livro “Kardec para Mulheres”, Pré-lançamento da Editora KARDEC Books - um projeto do IDEAK.
Uma correspondência de Crefeld - Prússia Renana, de 25 de janeiro de 1862, e inserta em o Constitucionnel de 4 de fevereiro, contém o seguinte fato:
O padeiro desumano
Uma pobre viúva, mãe de três filhos, entra numa padaria e pede insistentemente que lhe vendam um pão fiado. O padeiro se recusa. A viúva reduz o pedido a meio pão e, por fim, a uma libra de pão, apenas para seus filhos famintos. O padeiro recusa ainda, deixa o lugar e vai para o fundo da padaria. Crendo não ser vista, a mulher toma um pão e sai. Mas o roubo, imediatamente descoberto, é denunciado à polícia.
Um agente vai à casa da viúva e a surpreende cortando o pão em pedaços para os filhos. Ela não nega o roubo, mas se desculpa com a necessidade. Embora censurando a dureza do padeiro, o agente insiste para que ela o acompanhe até o comissário.
A viúva pede apenas alguns instantes para trocar de roupa. Entra no quarto, mas demora bastante até que o agente, perdendo a paciência, resolve abrir a porta. A infeliz estava estirada no chão, coberta de sangue. Com a mesma faca com que cortava o pão para os filhos, tinha posto fim a seus dias.
Tendo sido lida a notícia na sessão da Sociedade de 14 de fevereiro de 1862, foi proposta a evocação dessa infeliz, quando ela mesma veio manifestar-se espontaneamente, na comunicação que segue.
Acontece muitas vezes que assim se revelam Espíritos de quem falamos. É fora de dúvida que são atraídos pelo pensamento, o que é uma espécie de evocação tácita. Eles sabem que a gente se ocupa deles e vêm. Então se comunicam, se o momento é propício ou se acham um médium que lhes convém. De acordo com isso, compreende-se que não há necessidade de ser um médium, e nem mesmo de ser espírita, para atrair os Espíritos com os quais a gente se ocupa.
Deus foi bom para a pobre alucinada e venho agradecer-vos a simpatia que tivestes a bondade de me testemunhar. Ah! Diante da miséria e da fome de meus pobres filhinhos, esqueci-me e fali. Então eu disse a mim mesma: Se és impotente para alimentar teus filhos e o padeiro recusa o pão aos que não podem pagar; se não tens dinheiro nem trabalho, morre! Se não estiveres mais com eles, alguém virá em seu auxílio.
Com efeito, hoje a caridade pública adotou esses pobres órfãos. Deus me perdoou, porque viu a razão vacilar no meu atroz desespero. Fui a vítima inocente de uma Sociedade má, muito mal regulada. Ah! Agradecei a Deus por vos ter feito nascer neste belo país da França, onde a caridade vai descobrir e aliviar todas as misérias.
Orai por mim, a fim de que possa em breve reparar a falta que cometi, não por covardia, mas por amor materno. Como os vossos Espíritos protetores são bons! Eles me consolam, me fortalecem, me encorajam dizendo que o meu sacrifício não foi desagradável ao grande Espírito que, sob os olhos e a mão de Deus, preside os destinos da Humanidade.”
A Pobre Mary
(Médium: Sr. d’Ambel)
Em seguida à comunicação, o Espírito de Lamennais fez a seguinte apreciação sobre o fato:
“Essa infeliz mulher é uma das vítimas do vosso mundo, de vossas leis, de vossa sociedade. Deus julga as almas, mas também julga os tempos e as circunstâncias; julga as coisas forçadas e o desespero; julga o fundo e não a forma. E ouso afirmar: essa infeliz matou-se não por crime, mas por pudor, por medo da vergonha. E que onde a justiça humana é inexorável, julga e condena os fatos materiais, a justiça divina constata o fundo do coração e o estado de consciência. Seria desejável que em certas naturezas privilegiadas fosse desenvolvido um dom que seria muito útil, não para os tribunais, mas para o adiantamento de algumas pessoas: esse dom é uma espécie de sonambulismo do pensamento que descobre muitas vezes as coisas ocultas, mas que o homem habituado à corrente da vida negligencia e atenua por sua falta de fé. E certo que um médium desse gênero, examinando essa pobre mulher, teria dito: “Essa mulher é abençoada por Deus porque é infeliz e esse homem é amaldiçoado porque recusou o pão”. O Deus, quando, pois, todos os teus dons serão reconhecidos e postos em prática?
Aos olhos de tua justiça, o que recusou o pão será punido porque Cristo disse:
“Aquele que dá pão a seu próximo, a mim o dá”.
LAMENNAIS (Médium: Sr. A. Didier)
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